Uma Biografia do Câncer


     O Imperador de Todos os Males - Uma Biografia do Câncer (Companhia das Letras, 634 páginas, tradução de Berillo Vargas), do oncologista Siddhartha Mukherjee, professor da Universidade Columbia, é um livro brilhante. Conta a história da doença desde o seu “início” — há milhares de anos — e nota que sua expansão se deve à civilização. Mukherjee, que ganhou o Prêmio Pulitzer com o livro, escreve muito bem, sem usar, em nenhum momento, o impenetrável jargão acadêmico. Trata-se de uma obra séria, que certamente não desagrada o especialista e agrada muitíssimo o leigo. “O câncer”, diz Mukherjee, “é uma das doenças mais antigas já vistas num espécime humano — muito provavelmente a mais antiga”.
     Há registro em documentos provando que o câncer era conhecido há centenas de anos. Arqueólogos descobriram, em 1914, uma múmia egípcia de 2 mil anos “com um tumor invadindo o osso da bacia”. Louis Leakey “descobriu um maxilar datado de 2 milhões de anos atrás que traz os sinais de uma forma peculiar de linfoma encontrada endemicamente na África meridional”.

      Nas sociedades mais antigas, as pessoas não viviam o suficiente para desenvolver o câncer. Homens e mulheres eram consumidos bem antes por tuberculose, hidropsia, cólera, varíola, lepra, peste ou pneumonia” (nos Estados Unidos, no século 19, a pessoa vivia em média 47 anos).
     O câncer “só se torna comum quando todas as outras doenças mortais são combatidas”, diz Mukherjee.

    No século 19, pensava-se que a civilização, com sua pressa e excessos, era uma das causas do câncer. Mukherjee contesta: “A civilização não é a causa do câncer, mas, ao prolongar a vida humana, ela o desvela. (...) O câncer é uma doença relacionada com a idade”.

    O câncer “apareceu” mais, afirma o oncologista, também por outro motivo. “Nossa capacidade de detectar o câncer cada vez mais cedo e de lhe atribuir mortes com precisão também espetacularmente no século passado. (...) E as técnicas de cirurgia, biópsia e autópsia aguçaram ainda mais a nossa capacidade de diagnosticar o câncer. A introdução da mamografia, para detectar o câncer de mama mais cedo em sua evolução, aumentou drasticamente sua incidência.”

    Mukherjee preocupa-se inclusive em explicar a origem da palavra câncer. “Foi na época de Hipócrates, por volta de 400 a. C., que um termo para câncer apareceu pela primeira vez na literatura médica: karkinos, da palavra grega para ‘caranguejo’. O tumor, com os vasos sanguíneos inchados à sua volta, fez Hipócrates pensar num caranguejo enterrado na areia com as patas abertas em círculo. A imagem era peculiar (poucos cânceres, a rigor, se parecem com caranguejos), mas também vívida.”

    A história do nascimento da quimioterapia, uma criação do patologista Sidney Farber, é um dos pontos altos do livro. Mukherjee conta que, errando às vezes, provocando até mortes de crianças, Farber foi decisivo para criar a quimioterapia.

FONTE: Bula Revista, 29/04/2012

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